segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Crítica - A família

Aos bons companheiros...

E se James Conway, personagem de Robert De Niro em Os bons companheiros, clássico mor do cinema de Martin Scorsese, se tornasse um delator e entrasse para o programa de proteção a testemunhas do FBI? É a partir desse raciocínio fanfarrão que Luc Besson, partindo de um romance policial francês chamado “Malavita” – traduzido nos EUA para “badfellas” (trocadilho infame com o nome original de Os bons companheiros, Goodfellas), volta à direção com A família (Malavita, FRA/EUA 2013).
O filme é uma reverência a um dos maiores dogmas do cinema americano, o filme de gangster. É, ainda, uma homenagem formal a Martin Scorsese, que surge como produtor executivo do filme, e é, também, uma homenagem para lá de afetiva à carreira de Robert De Niro - com especial carinho a sua eloquência no uso da palavra “fuck”.
Por essas razões, A família já se assevera como um entretenimento acima da média, especialmente para cinéfilos, que poderão se deliciar com referências sortidas ao longo da fita.
A trama é simples, Giovanni Manzonni entregou sua família (a mafiosa) ao FBI e desde então sua rotina é constituída de mudanças e novas identidades enquanto frustra as tentativas da máfia de matá-lo e a sua família – aquela do núcleo tradicional.
De Niro e Michelle: quando atuar é um prazer...
O filme começa com Manzonni e sua família chegando à Normandia, cidadezinha histórica, mas pacata do sul da França. A graça inicial reside no fato dele e sua família – composta ainda por Michelle Pfeiffer (a esposa), Dianna Agron (filha mais velha) e John D´Leo (filho mais novo) – penarem para deixar para trás o ranço de mafiosos e a maneira como estes lidam com a vida e seus dissabores.
Há ainda Tommy Lee Jones como o agente do FBI carrancudo responsável pela segurança da família. É especialmente charmoso ver Tommy Lee Jones em seu melhor papel (o agente da lei carrancudo) medindo forças com De Niro em seu melhor papel (o gangster cheio de carisma). 
Como se não bastasse toda a finesse no trato dos clichês dos filmes de máfia, Besson ainda oferta uma das melhores cenas do cinema em 2013 e uma deferência espirituosa a Scorsese quando coloca o personagem de De Niro como palestrante convidado de um cineclube de sua vizinhança que exibirá o clássico americano Os bons companheiros.

Essa afetuosidade a instituições do cinema americano e a leveza com que pisca o olho para o público fazem de A família um filme diferenciado tanta da perspectiva da sátira, como da comédia.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Em off

Nesta edição da seção Em off, Batman reloaded, o cinema mexicano insurge ao topo da América Latina, a ansiedade aperta por alguns dos grandes lançamentos do ano, os filmes imperdíveis do festival do Rio, strippers famosos do cinema e Jennifer Aniston cada vez mais à vontade no ecrã.

O cinema mexicano pede passagem...
Se o Brasil já perde, e feio, para a Argentina em matéria de cinema é bom ir se preparando para ser ultrapassado pelos mexicanos. Se é que isso já não aconteceu. Nos dois últimos festivais de Cannes, os diretores premiados foram mexicanos em uma clara demonstração de que há uma efervescência ali que está comovendo o circuito de arte e, principalmente, fomentando significativas mudanças criativas. Carlos Reygadas ganhou o prêmio em 2012 com Post Tenebrax Lux e, em 2013, foi a vez de Amat Escalante, cujo Heli – dimensionado por sua crueza e violência – é um dos principais destaques do festival do Rio que começou há poucos dias.





30 filmes imperdíveis do Festival do Rio 2013
A equipe do AdoroCinema preparou uma lista para lá de especial com alguns dos filmes que serão exibidos no evento que pautará a agenda cinéfila carioca pelos próximos dias. Muitos serão exibidos em breve nos cinemas brasileiros, mas quem se aguenta esperar?

Ainda o Batman de Ben Affleck...
George Clooney falou à revista Empire sobre a escolha do chapa Ben Affleck, para quem produziu Argo, para viver o homem-morcego no cinema. “Eu talvez seja a pessoa menos indicada para emitir uma opinião a respeito, já que praticamente destruí o personagem, mas acho que só podemos criticar algo quando esse algo está lá e o filme ainda não foi feito. Ben é um cara inteligente. Ele sabe o que está fazendo”.
A escolha de Affleck para viver Batman promoveu agito sem precedentes em Hollywood e atendeu mais do que o esperado aos anseios da Warner de promover uma verdadeira onda de ansiedade com tal anúncio.

Ainda o Batman de Nolan...
Prova de que Batman é mesmo o carro-chefe do estúdio é que nesta semana está sendo lançada a terceira coleção da trilogia orquestrada por Christopher Nolan no mercado americano. A “collector´s edition” da vez, como mostra a foto abaixo, vem recheada de mimos e com mais 40 horas de extras. O detalhe é que o terceiro filme da trilogia, com bem todos sabem, foi lançado nos cinemas no ano passado. Batman é mesmo uma mina de ouro...



Abstinência de Scorsese
O estúdio Paramount vive uma apreensão em particular. Martin Scorsese precisará de mais tempo para montar o corte final de O lobo de Wall Street, o filme mais aguardado do ano em nove de dez listas cinéfilas. O corte atual do filme tem cinco horas e estúdio e Scorsese querem reduzi-lo para duas horas e meia. Para que isso ocorra, será necessário adiar a estreia do filme – previamente marcada para 15 de novembro.
Para não perder sua boquinha no Oscar – afinal estamos falando de Scorsese – a Paramount tenta viabilizar o lançamento do filme no Natal, para que ainda seja elegível para o prêmio da Academia. Se esse cenário se concretizar, o filme de ação Jack Ryan – que retoma as aventuras do personagem criado por Tom Clancy – será remanejado para janeiro. Dedos cruzados!

Em 6 de dezembro?
O filme mais polêmico do ano, e que desperta mais curiosidade no mundo da cinefilia, ganhou data de estreia no Brasil. La vie d´Adèle, vencedor da Palma de Ouro no último festival de Cannes, teve sua estreia marcada para o dia 6 de dezembro. Uma das últimas polêmicas despertadas pelo filme, posterior a sua consagração em Cannes, ocorreu em virtude de uma declaração da atriz Léa Seydoux de que sentia de que “havia caído em uma armadilha” no tocante às cenas de sexo homossexual que fez com a atriz Adèle Exarchopoulos. O diretor do filme, o franco-tunisiano Abdellatif Kechiche, declarou que se sentia humilhado por essa colocação e que repensaria se o filme deveria, ou não, ser lançado comercialmente.



Arte subestimada
Fazer strip-tease é uma arte. Tem quem vá assistir Família do bagulho no cinema somente para ver Jennifer Aniston fazer seu show. Se há talentos natos como Channing Tatum (Magic Mike) e Natalie Portman (Closer - perto demais), há embaraços famosos (mas nem por isso menos sensuais) como Demi Moore em Striptease. O AdoroCinema juntou tudo e elaborou uma lista com 15 cenas de strip que trazem celebridades tirando a roupa. Confira!

Naughty girl

Jennifer Aniston pode não estar se reinventando como atriz, mas certamente está ousando. O seu strip de tirar o fôlego, para os padrões de um filme que se pretende familiar, é bom que se diga, se segue a participações desbocadas e desavergonhadas da atriz nos filmes Quero matar meu chefe (2011) e Viajar é preciso (2012). No primeiro filme ela faz uma ninfomaníaca incontrolável e que fala um monte de sacanagens e no segundo, faz uma mulher dispostas a novas experiências sexuais.
Jason Sudeikis, que fez par com ela em Quero matar meu chefe e fecha o ciclo (?) em Família do bagulho, é o que se chama de cara certo, no lugar certo...

Sobre famílias...
Uma coincidência que une dois filmes merece a menção por aqui. Duas comédias familiares sobre famílias que são, também, sátiras e recheadas de clichês estão em cartaz nos cinemas brasileiros. A família, de Luc Besson, mostra uma família de mafiosos tendo que se adaptar à vida no programa de proteção à testemunhas, enquanto que Família do bagulho (em uma exagerada terceira menção neste post), satiriza a classe média americana. As críticas serão publicadas em Claquete na segunda e terça respectivamente.

quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Projeto "Latitudes" renova linguagem e lógica narrativas

O diretor Felipe Braga (no primeiro plano), Alice Braga e Daniel de Oliveira: ousadia, comprometimento e novos horizontes estéticos em um filme que é, antes de qualquer coisa, um projeto

Filme? Série? Projeto? Latitudes é de tudo um pouco e, também, algo novo, cheio de oxigênio e liberdade que avoca o direito de nomear-se como projeto pela amplitude que o termo admite. É um “projeto transmídia”, nas palavras do diretor e principal idealizador Felipe Braga. Funciona assim: é, modo vulgar, um filme que mostra os encontros e desencontros do fotógrafo José (Daniel de Oliveira) e da editora de moda Olivia (Alice Braga) em diversas cidades do mundo. “É uma história de amor não romântica”, oficializa o diretor. Mas Latitudes não foi concebido para ser visto no cinema, da maneira convencional. Toda quarta-feira estreia no YouTube um novo episódio, serão 13 ao todo, mostrando o encontro desses personagens em uma cidade. Paris (França), Londres (Inglaterra), Veneza (Itália), José Inácio (Uruguai) e São Paulo (Brasil) foram as cidades dos cinco primeiros episódios. Os episódios duram cerca de 13 minutos.  Na segunda-feira seguinte, o mesmo episódio é exibido na TNT, canal do grupo Turner disponível nos pacotes mais básicos de qualquer programadora de TV por assinatura, com um valioso adendo: o episódio exibe cenas de bastidores em que o diretor orienta seus atores e em que Alice e Daniel fazem leituras dos textos, compartilham impressões gerais e discutem sobre os rumos dos personagens.
Além do voyeurístico e cinéfilo olhar sobre o processo de produção de um filme calcado na intimidade e investigação de dois personagens, esse expediente se revela intrínseco à narrativa multiplataforma que o diretor objetiva. Decerto, há uma ideia de liberdade nesses bastidores diferenciada daquela que se assume para uma produção de filme, mas o convite a essa espiada por detrás da cortina é legítimo. Braga brinca com sua narrativa de maneira salutar. Ora sobrepõe os diálogos ensaiados aos da ficção oficial, ora sublinha a perspicácia e desenvoltura dos atores na promoção de adaptações dos diálogos e interpretações dos desejos e impulsos dos personagens. É um fôlego novo na investigação, no estudo de personagens, em que ele apresenta os atores como parceiros do público.
Daniel e Alice: ensaio que também faz parte da narrativa...
Toda a dinâmica do casal é muito sensual. O primeiro episódio, passado no confinamento de uma suíte de hotel em Paris, é de uma sensualidade atroz. Daniel e Alice disparam diálogos com efervescência, mas Braga quebra essa rotina com inserções dos ensaios. Em um momento de tensão de uma cena em que os personagens disputam o controle sobre o outro, uma característica da dinâmica deles nos três primeiros episódios, Braga quebra a tensão demonstrando o erro de Daniel de Oliveira na cena. Esse recurso é usado em outras cenas de tensão; como no quarto episódio, em que os personagens buscam controle, mas agora sobre seus próprios sentimentos.
Latitudes, no contexto da distribuição, é vanguardista. Steven Soderbergh lançou Bubble simultaneamente no cinema, na internet e na TV em 2005, mas a inovação competia apenas à distribuição. Aqui a distribuição não só se renova em termos de gradação, o filme ganha estrutura episódica e serializada, como influencia na narrativa. Quem acompanha o projeto pela internet tem uma experiência, quem acompanha pela tv tem outra e quem acompanha pela internet e depois pela tv tem outra ainda mais distinta.
Se na distribuição, que afeta a narrativa, Latitudes se coloca na vanguarda, na narrativa é um projeto ainda mais inventivo e inquieto. Os episódios sempre terminam em picos de tensão, com os chamados ganchos, mas também com uma trama mais coesa, mais completa, mais redonda – algo que não necessariamente se verifica nas séries a granel. Ademais, a intercalação das cenas de ensaio, com cenas do filme, com o off vazado do diretor lendo o roteiro ou comentando os efeitos de particular cena mais a frente no episódio, proporcionam uma interação jamais experimentada em termos de narrativa no cinema. Não que seja o melhor modelo a se seguir, o cinema paralisaria se seguisse um único e dito melhor modelo, mas é um modelo muito eficiente para os propósitos dramatúrgicos perseguidos por Latitudes. Essa compreensão de tempo, espaço, ritmo e esse azeitamento, que surge na versão televisiva de Latitudes, fazem do projeto algo ímpar – conceitual e ontologicamente - no cenário do audiovisual brasileiro ou mesmo internacional.

Alice e Daniel em cena do primeiro episódio "Destino Paris": é possível acompanhar os novos episódios no canal do projeto no YouTube

Confira o primeiro episódio de Latitudes

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Spotlight on - Cinema de crise

Enquanto se avizinha a próxima temporada do Oscar, já se deflagra uma expectativa nos bastidores para quem acompanha com intimidade, profissionalismo, paixão e reflexão o cinema como um todo.
Os principais pleiteantes ao Oscar nessa fase pré-corrida, em comum, têm uma característica de lidar e abordar, de alguma maneira, circunstâncias de crise. Seja ela existencial, como nos casos de Gravidade – em que uma mulher abalada com a morte da filha precisa lutar para sobreviver na imensidão do espaço, 12 years a slave – em que um homem livre é sequestrado e vendido como escravo, Blue Jasmine – em que uma ex-rica precisa se adaptar à vida de pobre, Álbum de família – sobre dificuldades familiares embaladas por uma doença fatal; ou crises de fundo mais sociológico como em O lobo de Wall Street, em que Martin Scorsese investiga os porões dos anos 90 em busca dos frangalhos da geração yuppie.
Cate Blanchett como uma mulher que precisa se reinventar em Blue
Jasmine:
cinema de crise é cinema cheio de oportunidades
Esse cinema de crise saiu fortalecido da última edição do festival de Veneza. Como já discutido anteriormente em Claquete, o documentário Sacro GRA é um filme que fala implicitamente da crise econômica que afeta com requintes de crueldade o país e, sua consagração em Veneza, sinaliza para a crise da qual o cinema de arte precisa se deslocar. Mas não é só o cinema de arte que está encapsulado nessa crise. O cinemão, como demonstrou a última temporada do verão americano, também está em crise. Executivos estão encomendando estudos e análises para saber que diabos os (poucos, mas expressivos) sucessos e (muitos) fracassos da temporada significam.
Como se vê, há crise por todos os cantos. De Woody Allen a Martin Scorsese, passando pelo novo de Spike Jonze (Her)em que um homem se apaixona pela voz de seu computador – uma versão mais robusta do Siri. “É sobre a nossa necessidade de se conectar. É sobre solidão, também”, disse Spike Jonze para uma atenta plateia no último festival de Toronto.
Para um filme ser dramaticamente eficiente é necessário que haja um conflito, mas a convergência de filmes que abordam crise e que são, eles mesmos, representações dessa crise (como o vencedor de Veneza) extrapola os limites da coincidência. Esse recorte ainda deverá ser mais explorado, até porque não há garantias formais de que a corrida pelo Oscar tomará as formas que neste momento se imagina. A tendência de se falar de crise não é essencialmente nova. Já teve seus ciclos ao longo da história do cinema. Mas como em toda crise há oportunidades, muita coisa boa pode estar a caminho.

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A escolha de "O som ao redor" para representar o Brasil no Oscar 2014



A escolha de O som ao redor para representar o Brasil na disputa por uma vaga entre as produções indicadas a melhor filme estrangeiro no Oscar rompe com um paradigma brasileiro de pensar essencialmente no tipo de filme que deve disputar o Oscar e não necessariamente naquele que merece a chance. Esse raciocínio tenta cristalizar o perfil dos filmes que agradam aos votantes da academia no tocante a produções estrangeiras, polo setorizado da academia em que um colegiado reduzido elege os concorrentes. É uma tarefa ingrata e, como prova o histórico, de cálculo imprevisível. Intocáveis, fita francesa de imenso apelo emocional e redondinho em matéria de cinema era dado como favas contadas na categoria em 2013 e acabou de fora, apesar de ter sido um sucesso clamoroso de público nos EUA. Cidade de Deus, Tropa de elite e O palhaço foram ótimos filmes brasileiros que conciliaram força narrativa, sobejamento estético, mas erraram no timing. No caso emblemático de Cidade de Deus, houve um posicionamento da Academia que, no ano seguinte a sua candidatura para filme estrangeiro, elevou o filme de Fernando Meirelles de patamar o nomeando a quatro Oscars (direção, roteiro adaptado, montagem e direção de arte). Nenhum outro filme estrangeiro negligenciado teve esse acolhimento a posteriori pela Academia desde então.
A Academia, de maneira geral, está mais atenta à produção internacional. Nem tanto pela vitória de O artista há dois anos, mas pela inclusão em larga escala do austríaco Amor no Oscar passado. Filme denso, “de festival”, Amor era certeza de prêmio entre os estrangeiros desde sempre. É possível identificar paralelos entre o filme de Michael Haneke e o de Kleber Mendonça Filho.
Primeiro por se tratarem de filmes egressos de festivais e com ampla aprovação da crítica internacional. Segundo por apresentarem direções rigorosas em que há controle e perfeccionismo por parte da realização em medida ímpar. Em ambos os filmes, sobriedade e técnica se sobressaltam à emoção. Não se advoga, porém, que O som ao redor receberá da Academia o mesmo frisson que Amor recebeu. Avalia-se, porém, que a escolha do filme encontra ressonância em um olhar mais aberto, experimentado e sensível que a Academia de Hollywood vem dispensando às produções estrangeiras. Em geral mais inventivas, amargas e arrebatadoras do que àquelas que frequentam as principais categorias do Oscar.

Kleber Mendonça Filho orienta seu elenco para uma das cenas capitais de O som ao redor: "a escolha valoriza o filme e o fará ser mais visto", disse o diretor à imprensa depois do anúncio da semana passada

Do lado de dentro
Mais do que qualquer outra coisa, a escolha de O som ao redor pelo Ministério da Cultura (MinC) para tentar esta vaga entre os filmes estrangeiros no Oscar, coloca a crítica como aliada do postulante brasileiro. Vale lembrar que o filme é altamente conceituado no gabarito dos principais críticos americanos. Se há uma categoria em que críticos americanos exercem influência com alguma liberdade é justamente na categoria de filmes estrangeiros.
Por outro lado, há uma questão política implícita na escolha. Com bons postulantes à vaga, alguns até mesmo melhores do que O som ao redor, o MinC privilegiou um filme feito às margens da própria escala de produção do cinema nacional. Sem apoio da indústria (Globo Filmes) ou estatal - pelo menos no viés nacional. Ao indicar um filme independente, no espírito e no financiamento, referenda-se um caminho alternativo e se estimula uma produção divergente da tônica nacional. Novidade muito bem vinda, por sinal.
O som ao redor não é o melhor filme brasileiro do ano, mas é aquele com mais e melhores predicados para um voo tão ardil e cheio de sobressaltos como o Oscar. Sem querer querendo o Brasil fez o de sempre, mas fez, também, diferente.

domingo, 22 de setembro de 2013

Insight - O Oscar dos negros

O diretor Steve McQueen, o segundo da direita para a esquerda, e o elenco de um dos pré-candidatos ao Oscar, 12 years a slave

O Oscar de 2002, que consagrou Denzel Washington e Halle Berry como os melhores atores do ano (no caso de Berry, ela foi a primeira atriz negra a triunfar na categoria principal), além de conceder prêmio honorário a Sidney Poitier – o primeiro ator negro a ganhar um Oscar – é conhecido como o Oscar negro. O próximo Oscar, ensaiam os primeiros prognósticos da temporada de ouro do cinema americano, pode reclamar esse estigma para si.
12 years a slave, um filme que versa sobre a escravidão, mas a partir de um prima completamente renovado – um homem negro livre sequestrado e vendido como escravo, está na dianteira nas casas de apostas. Seu diretor, Steve McQueen, que já merecia indicação por Shame, figura entre as certezas na categoria de direção. O protagonista, Chiwetel Ejiofor é outro dado como carta marcada na disputa por melhor ator. Categoria esta que pode registrar recorde de atores negros em disputa, se confirmadas as boas expectativas em relação a Forest Whitaker, protagonista do dramalhão de Lee Daniels (que foi apenas o segundo diretor negro indicado ao Oscar – em 2010 por Preciosa – uma história de esperança), em O mordomo da Casa Branca. Whitaker ganhou o Oscar de melhor ator em 2007 por O último rei da Escócia tornando-se apenas o quarto negro a triunfar na categoria principal, mas o terceiro em um espaço de cinco anos. O inglês Idris Elba, que vive Nelson Mandela em Mandela: long walk to freedom, é outro nome bem cotado. Assim como Michael B. Jordan que faz o jovem assassinado por policiais em Fruitvale Station, sensação indie da temporada. Se três desses conseguirem emplacar indicações, o recorde já estará consolidado.

Denzel Washington e Halle Berry com seus Oscars conquistados há 11 anos: novo recorde a caminho? 

Oprah Winfrey, que é uma das mais poderosas personalidades americanas, é outra aposta certeira entre as atrizes coadjuvantes pelo filme O mordomo da Casa Branca. Ela já foi indicada na categoria pelo filme A cor púrpura na década de 80

Além de Lee Daniels e Steve McQueen, Spike Lee é outro que pode figurar na lista com seu remake do clássico sul-coreano Oldboy. Mas é uma possibilidade distante. Fato é que até hoje apenas dois negros foram indicados a melhor diretor e neste ano três aparecem com filmes conceituados na praça.  
David Oyelowo (O mordomo da Casa Branca) e Barkhad Abdi, que faz um pirata somali em Captain Phillips, estão entre os nomes aventados para a categoria de ator coadjuvante.
Na equivalente categoria feminina, muitas pretendentes negras também. Oprah Winfrey, por O mordomo da Casa Branca, é o maior destaque. Mas há, ainda, Lupita Nyongo (12 years a slave), Naomie Harris (Mandela: long walk to freedom) e a previamente vencedora na categoria Octavia Spencer por Fruitvale Station.
É muito improvável que todos esses pleiteantes garantam vaga entre os finalistas, mas o número de concorrentes bem direcionados é um convite à academia a demolir, de uma vez por todas, a injusta máxima de que é segregacionista.  

Idris Elba caracterizado como Nelson Mandela: depois de render indicação a Morgan Freeman em 2010, personagem pode valer primeira indicação ao Oscar para o ator britânico 

sábado, 21 de setembro de 2013

Especial Elysium - Cinema do mundo


Não é de hoje que se sabe que as bilheterias internacionais são a menina dos olhos dos grandes estúdios hollywoodianos. Um dos sintomas é a maratona promocional, a que os astros de cinema se submetem, ainda mais excruciante com destinos exóticos como Brasil, Rússia e Coréia do Sul cada vez mais inseridos no cronograma de divulgação de produções tão díspares como Oblivion, Se beber, não case e outras maçarocas hollywoodianas. 2013 só não bateu o recorde de astros e estrelas em terras brasileiras porque os protestos iniciados em junho afugentaram os Brads Pitts da vida.
A chinesa Bingbing como estratégia de
consolidação de marketing 
Outro sintoma da importância do mercado internacional para uma típica produção americana é a presença cada vez mais consolidada e ansiada por executivos de atores a atrizes de toda parte do globo. Em Homem de ferro 3, a atriz chinesa Fan Bingbing entrou apenas para agradar o mercado chinês. Sua participação, inclusive, foi dilatada na versão do filme que chegou aos cinemas daquele país. O filme também teve imagens gravadas na China como forma de despertar o interesse local pela produção.
Para Elysium, Neill Blomkamp queria um elenco internacional, prioritariamente oriundo de países subdesenvolvidos, por razões pertinentes à narrativa – que trata do eterno conflito entre ricos e pobres, mas coincidiu com o interesse do estúdio de internacionalizar o elenco do filme que, para todos os fins, se passa em Los Angeles e no satélite denominado Elysium. Blomkamp foi buscar Wagner Moura, ator que é expoente no Brasil, para viver um dos principais personagens do filme. O mexicano Diego Luna, a também brasileira Alice Braga e o sul-africano Sharlto Copley completam o elenco multicultural.

A tendência de elencos globalizados é acompanhada pela disposição de ir filmar fora dos EUA. Nunca antes tantas produções de verão foram filmar fora dos EUA ou do Canadá (já que Vancouver e Toronto são historicamente locações acessíveis - em termos financeiros e de logística – para os estúdios). Da trilogia Os mercenários, passando por Star Trek, 300: a Ascensão de um império e Wolverine: imortal (outro que sobeja em atores não americanos – a começar pelo próprio Hugh Jackman), Hollywood nunca foi menos Hollywoodiana.

Wagner Moura e Alice Braga, com a estampa de Matt Damon ao fundo: foco na internacionalização dos blockbusters americanos....

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Crítica - Boa sorte, meu amor

Ambição e diapasão

Que o cinema pernambucano é o principal cartão postal do cinema brasileiro já se sabe, mas é interessante observar a unidade estética e narrativa que essa nova geração de cineastas do Estado apresentam. Boa sorte, meu amor, filme que marca a estreia de Daniel Aragão como cineasta, dialoga intimamente com O som ao redor. Não só por emprestar deste uma atriz emblemática (Maeve Jinkings), mas por ter na complexa e delicada relação entre classes sociais tensionadas em uma Recife desproporcional, o eixo central de sua dramaturgia. Aragão que foi produtor de elenco do filme de Kleber Mendonça Filho apresenta um filme mais senhor de suas complexidades e fidedigno aos personagens que retrata. Nesse sentido, agiganta-se. Ainda que não se compare à ambição temática, no tocante à pluralidade com que tangencia a tensão entre diferentes classes sociais, de O som ao redor.
Em Boa sorte, meu amor, Aragão mostra a história de amor de Maria (Christiana Ubach) e Dirceu (Vinicius Zinn). Ela pobre, migrante de uma cidadezinha interiorana castigada pela seca e miséria. Ele, de classe média alta e naquela fase de choque com seu pai. A aproximação e subsequente distanciamento entre os dois é o fio condutor de uma história que ambiciona exibir as contradições e tensões entre as classes sociais e as cicatrizes que o crescimento econômico deixa nessas relações (sociais, amorosas e/ou pessoais).  É, enfim, um cinema de signos sobre símbolos.
Aragão abre seu filme com Dirceu, entre sombras, ouvindo uma história de seu pai. Eles estão sentados à mesa, aquela larga de madeira que não se vê mais hoje em dia, em lados opostos. A câmara se aproxima do rosto do pai de Dirceu à medida que ele se aproxima do clímax de sua história. Um conto que começa com os barões estuprando as indiazinhas de 11 anos e, como método contraceptivo, as enforcando em seguida e termina com uma dessas indiazinhas deitando-se à cama oficial do tetravô de Dirceu. Nesse poderoso prólogo, que integra o primeiro dos três capítulos que constituem o filme, nomeado “Você é o que você perde”, o filme já capitaliza toda a sua força. Se fosse um curta-metragem, seria um curta-metragem esplêndido em técnica e narrativa.
O rigor técnico a serviço de uma narrativa que busca iluminar conflitos adormecidos ou sombreados, aliás, é outra forte referência do filme.
O seu grande atrativo é, também, seu calcanhar de Aquiles enquanto cinema. Tal qual O som ao redor, Boa sorte, meu amor é um filme para críticos. Não que o público comum não seja capaz de capturar a essência do que ambiciona Aragão com seu filme, mas essa absorção jamais será completa. Essa vaidade do “eu sei fazer cinema” talvez esteja relacionada a uma fase de afirmação desses cineastas de inegável talento e com muito a dizer. Boa sorte, meu amor, de certa maneira, já é mais coeso narrativamente do que o era O som ao redor, para nos atermos à comparação motriz dessa crítica.
Nesse jogo de ambição e diapasão, o cinema brasileiro sai ganhando; ainda que seu público não perceba de pronto.  

Especial Elysium - O dia depois de amanhã

Futuros distópicos voltam à ordem o dia com a estreia de Elysium nos cinemas brasileiros, mas eles estão sempre em pauta quando o assunto é ficção científica casca grossa no cinema. Claquete selecionou dez filmes que focam na distopia que os criativos e pessimistas escribas de Hollywood (ou da ficção científica literária que Hollywood se serve) alinharam para o futuro da humanidade.

Matrix (1999)
A humanidade é totalmente controlada pelas máquinas, mas rebeldes desejam reaver o livre arbítrio em um filme que embala o futuro apocalíptico com filosofia, kung fu e gadgets hi-tech.

Blade runner – o caçador de androides (1982)

Colonização espacial, replicantes, alterações genéticas... tudo faz parte do escopo do mais influente filme de ficção científica da história do cinema. O clássico de Ridley Scott coloca Harrison Ford no centro de um motim de replicantes que facilitarão descobertas inimagináveis.  

Fuga no século XXIII (1976)

A vida é perfeita no século 23, mas só se pode viver até os 29 anos. Logan (Michael York) é um caçador de fugitivos que, mesmo ciente dos riscos, resolve também ele fugir quando chega a hora de ser executado.

O livro de Eli (2010)

Em um futuro devastado por uma terceira grande guerra, Denzel Washington é o Eli do título que guarda o que acredita ser a esperança da humanidade. Com canibais à espreita e escassez de água, ele precisa completar sua jornada.

Brazil – o filme (1985)

A luta de classes dá o tom nessa comédia distópica de Terry Gilliam que virou objeto de culto.

A estrada (2010)

Premissa parecida com a do filme de Denzel Washington, mas nessa adaptação da obra de Cormac McCarthy tudo é mais intimo e grave no acompanhamento que se faz da luta pela sobrevivência de um pai e seu filho em uma América devastada e sem rumo.

Os 12 macacos (1995)

Mais um de Terry Gilliam na lista. Bruce Willis, em 2035, é um homem que aceita voltar ao passado para desvendar o mistério em torno de um vírus mortal que dizimou grande parte da humanidade. No passado, no entanto, é tomado como louco e levado para um hospício.


Gattaca  - a experiência genética (1997)

Em um futuro em que os humanos são criados geneticamente em laboratórios, aqueles concebidos naturalmente são considerados inválidos.

Repo men – o resgate de órgãos (2010)

Em um futuro próximo, a sociedade utiliza os serviços da empresa The union, que fornece sofisticados e caros órgãos mecânicos para seres humanos. Se a pessoa não for capaz de pagar pelo que recebeu, entram em cena os coletores.

Minority report - a nova lei (2002)

Tom Cruise e Steven Spielberg juntam forças para mostrar que a corrupção chegou a um futuro onde o culpado por um crime é preso antes mesmo de cometê-lo. Baseado em conto de Philip K. Dick, Minority Report apresenta questionamentos morais que se bifurcam e se confrontam.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Crítica - Dose dupla

Ação com muito riso, tem mais siso

Comédias de ação, há pelos menos quatro anos, estão em voga no cinema americano. Há aquelas que se saem muito bem, como Encontro explosivo (2010) e Anjos da lei (2012), e os que ficam pelo meio do caminho como Caçador de recompensas (2010) e Par perfeito (2010). Dose dupla (2 guns, EUA 2013), adaptação de uma obscura graphic novel, é desses acertos que ninguém espera. A começar pela escalação da dupla de protagonistas. Mark Wahlberg e Denzel Washington. O diretor, Baltasar Kormákur (que já havia trabalhado com Wahlberg em Contrabando), não inspirava a confiança que muitos papas do cinema de ação capitalizam quando decidem fundir comédia e ação. Mas o filme é diversão pura. Banhado em humor negro e com um roteiro que tira sarro escancaradamente da CIA - ainda que sem a desenvoltura dos irmãos Coen em Queime depois de ler (2008) - Dose dupla se firma como entretenimento de alto gabarito.
Denzel Washington é uma atração em particular exercitando um timing cômico incomum em sua carreira.
Na trama, Wahlberg e Washington fazem dois parceiros que se levantam contra um rei do tráfico de drogas e pretendem roubar o banco no qual ele assenta parte de sua contabilidade. Ocorre que ambos são agentes da lei. Um do DEA (agência de combate ao tráfico de drogas) e outro da inteligência da Marinha americana que agem sem a ciência do outro. Eles acabam trapaceados em jogo de gato e rato que mobiliza diversas agências de inteligência dos EUA. Uma piada só!
Dose dupla vem confirmar, ainda, o talento natural e cada vez mais em evidência, de Wahlberg para o humor. Ele faz ótima tabela com Washington e garante que seus personagens somem qualidade à vasta galeria de ótimas duplas de policiais no cinema.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Crítica - Invocação do mal

O mal está nos detalhes

O malaio James Wan é aquele tipo de cineasta que vai evoluindo conforme se exercita. Causou grande comoção em 2004 com um pequeno e altamente original filme de terror em que dois homens acorrentados em um banheiro precisavam entender o jogo sádico que os propunha soluções drásticas para sair daquelas circunstâncias. Ali, Wan criara um monstro. Jogos mortais virou uma das principais e mais influentes franquias de terror da atualidade. Ele então se retirou do terror gore e foi exercita-se em filmes como Sentença de morte (2007), em que um insano Kevin Bacon adentra uma devastadora espiral de vingança e destruição, e Sobrenatural (2010), que acabou de ter sua segunda parte lançada nos cinemas americanos. Prestes a conferir novo rumo na carreira, assumindo a direção do sétimo Velozes e furiosos, Wan apresenta aquele que no contexto de sua filmografia é sua obra-prima: Invocação do mal (The conjuring, EUA 2013). O filme que foi sensação nos cinemas americanos, tem todos os predicados para repetir o feito nos cinemas brasileiros.
Se visualmente, Wan já era um diretor impressionante, aqui ele obtém graduação em termos narrativos. Ele domina como poucos no cinema mainstream contemporâneo os expedientes do cinema do gênero. Há cenas em Invocação do mal muito bem pensadas, planejadas para ensejar aquele frio na espinha da plateia. Você pode até não tomar sustos ao longo do filme, embora recursos de sonoplastia cá e lá surjam com a convicção habitual, mas cenas como a de uma singela brincadeira de esconde-esconde ou de sonambulismo, ou mesmo de pés puxados à noite elevam Invocação do mal àquele patamar narrativo em um filme de horror que não se verificava desde O sexo sentido (1999), curiosamente o último filme do gênero a surpreender em uma temporada do verão. Lá M. Night Shyamalan apresentou com sagacidade toda essa verve narrativa que Wan tão candidamente oferece aqui e depois virou refém dela. O que diferencia os dois filmes, é que enquanto em O sexto sentido a originalidade da proposta se intensifica no desfecho, em Invocação do mal há uma concessão da realização ao manual hollywoodiano para o gênero.

Agonia e desespero: filme consegue suscitar medo, ainda que espectadores mais escaldados no gênero não levem sustos

É inegável que ancorar seu filme na realidade é uma estratégia vencedora. Os investigadores do sobrenatural e demais atividades paranormais Ed e Lorraine Warren, vividos com competência por Patrick Wilson e Vera Farmiga, existiram de fato, assim com o caso – aqui condecorado com os artifícios da ficção – que move o filme. Não duvidar de seus heróis e firmar a lógica narrativa no ceticismo da plateia, que vai sendo destrinchado à medida que os fenômenos sobrenaturais vão se avolumando, se revela outro acerto da realização.
Outra grande sacada de Invocação do mal é “samplear”, importando um termo afeito ao universo da música, filmes de terror de outrora para melhor fundir a própria identidade do filme. De O iluminado ao contestado A casa amaldiçoada, além do resgate que promove da estrela daquele filme, Lili Taylor, passando pelo ventrículo de Jogos Mortais, as homenagens e influências resultam em um filme novo, vibrante e assustador na concepção clássica do termo.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Especial Elysium - O gênio (e a genialidade) de Matt Damon


É difícil não gostar dele! Matt Damon, quarentão com jeito de menino, é ator de notável senso de humor e ainda mais notável cálculo na gestão de sua carreira. Anunciou recentemente que fará sua estreia na direção e que permanecerá vinculado ao universo da ficção científica, já que integrará o próximo filme de Christopher Nolan, Interstellar. Seu debute no gênero foi em uma adaptação de Philip K. Dick, uma espécie de batismo de fogo no gênero, com Os agentes do destino (2011). No mesmo ano protagonizou Contágio do amigo Steven Soderbergh, com quem já rodou cinco filmes.
Eis aí outra característica proeminente em Damon. Ele valoriza suas parcerias. Depois de estar no epicentro da revolução do cinema de ação moderno com a trilogia Bourne, disse que só voltaria a viver o personagem se Paul Greengrass retornasse como diretor. Isso pode acontecer ou não, mas Damon – que ficou de fora do quarto filme – é um homem de palavra. De fé também. Fechou sua participação em The monuments men, novo filme do amigo George Clooney sem ler o roteiro, mas ciente de que o amigo não lhe decepcionaria.
Raciocínio semelhante aplicou na reedição da parceria com o cineasta Terry Gilliam que o dirigiu no subestimado Os irmãos Grimm (2005). Para The Zero Theorem, exibido no festival de Veneza deste ano, Damon tinha apenas quatro dias na agenda. Fez acontecer porque admira o trabalho e o cinema de Gilliam.
Durante sua trajetória para o estrelato, Damon surgiu como ele mesmo (de maneira pouco simpática) em séries como House of Lies e Entourage, demonstrando que sabe rir de si mesmo. Mas sabe falar sério também em filmes como Syriana – a indústria do petróleo (2005), Terra prometida (2012), Zona verde (2010) e O bom pastor (2006).
É de conhecimento público que tão logo ganhou notoriedade com o Oscar conquistado por Gênio indomável (1997), o ator passou a perseguir projetos que lhe permitissem construir uma personalidade midiática compatível com suas aspirações artísticas. A estratégia deu muito certo. Discreto na vida pessoal, Damon é reconhecido como um astro do cinema e, também, louvado por seus pares e pela crítica como um ator confiável.

Too Matt for your taste? Em Elysium, Damon aparece careca e tatuado. O ator não se incomodou de atuar em um lixão, onde rodou a maioria das cenas de seu personagem passadas no planeta Terra 

BFF: As carreiras seguiram rumos opostos, mas Matt Damon e Ben Affleck - em foto de 1998 - são para sempre...


A ficção científica, um dos últimos bastiões a ser explorado pelo ator no cinema, agora é um ponto estratégico para que o ele exerça seu poder de atração descolado do cinema de ação ou de seu personagem mais célebre (Jason Bourne). Elysium registrou boa bilheteria e ancorado na celebridade de Damon foi a melhor bilheteria da Sony nos EUA no verão de 2013. Ter se vinculado a Neill Blomkamp e não a M. Night Shyamalan como fez Will Smith, também para o estúdio Sony com Depois da Terra, é outro sinal do cálculo certeiro de Damon em seu traçado para ser aquele tipo de ator de quem é impossível não gostar.

domingo, 15 de setembro de 2013

Insight - Passando a régua no verão americano de 2013


O verão americano, em suma, repetiu uma tendência verificada nesses últimos anos: teve mais arrecadação e menos público. O recorde de ingressos vendidos, no entanto, não se deve tanto aos encarecidos tickets do 3D, ainda que eles tenham contribuído para o montante de U$ 4,75 bilhões – recorde absoluto. O recorde anterior, de U$ 4,4 bilhões, pertencia à temporada de 2011. É importante ter em mente que essas cifras se resumem apenas ao mercado norte-americano (que também computa o Canadá).
Se não foi o 3D e filmes de grande orçamento fracassaram em sua maioria, o que, afinal, fez valer esse recorde?
O comportamento do público frequentador de cinema estaria mudando? Essas são as principais reminiscências da temporada que consagrou sucessos improváveis como Invocação do mal, Truque de mestre (ambos com mais de U$ 200 milhões em caixa), The purge, O mordomo, Família do bagulho, As bem armadas, entre outros.
Mas o verão americano de 2013 teve mais. Muito mais. Robert Downey Jr. provou que é à prova de balas (e de desgaste de carisma) com Homem de ferro 3, filme que passou do bilhão de dólares (o único da temporada), e Will Smith não foi capaz de fazer o mesmo. Seu carisma foi testado e levado à beira do precipício com o pavoroso e fracassado Depois da terra. O bando de lobos voltou ao cinema e fechou por cima a trilogia acidental, mas não arrecadou o que a Warner esperava. Os estúdios, aliás, sofreram nessa temporada. A Disney anunciou que cortaria na carne, de novo, depois do fracasso de O cavaleiro solitário. Uma bomba lançada no dia da independência americana que valeu um prejuízo ao estúdio de U$ 200 milhões. A Warner, por sua vez, sem uma bilheteria vultosa, apesar da performance digna de O grande Gatsby, programa adulto em uma época em que reinam os adolescentes, se viu na contingência de antecipar a expectativa por um filme que só chegará aos cinemas em 2015. O confronto entre Batman e Superman foi anunciado com pompa na esteira do sucesso minguado de O homem de aço, que falhou em chegar ao bilhão de dólares, meta traçada pelo estúdio.
Brad Pitt, com uma intensa campanha de divulgação, conseguiu resgatar do que todos criam ser um fracasso certo, o caríssimo Guerra mundial Z, de longe o filme mais cool e bem azeitado da temporada.
Outro aspecto dessa temporada foi que os filmes de terror ocuparam o papel geralmente designado às comédias. Ainda que As bem armadas e Até o fim tenham feito algum barulho, foram os independentes de terror The purge e Você é o próximo que causaram alvoroço nas bilheterias. Os filmes que contemplam um público mais adulto também se deram bem em um período em que os estúdios se programam para agradar um público mais jovem. Além de O grande Gatsby, o novo Woody Allen, Blue Jasmine, foi um vencedor de alto pedigree. Entrou no top 10 americano mesmo sendo exibido em apenas 50 salas no país. E lá permanece! Filmes como Frances Ha, Muito barulho por nada e Fruitvale Station também capitalizaram, sugerindo que há uma demanda reprimida por filmes “mais sérios” nessa época do ano.

Brad Pitt tanto fez que salvou o seu Guerra mundial Z da zica que rondou os filmes de grande orçamento em 2013, mas ajudou o fato da produção dirigida por Marc Forster ser boa 

Cadê o sucesso que estava aqui? Johnny Depp e Armie Hammer culparam a crítica pelo fracasso de O cavaleiro solitário

Os estagiários foi concebido para ser uma potencial surpresa na temporada, tal como ocorrera em 2005 com Penetras bons de bico, mas em 2013 as surpresas foram do terror 

Traduzindo...
Star Trek – além da escuridão poderia ser apontado como o grande filme do verão americano de 2013 em termos de qualidade, rivalizando apenas com Guerra mundial Z. Os coadjuvantes dessa festa são muitos. As animações, que vêm decaindo em qualidade, mostraram vigor comercial com Meu malvado favorito 2, Universidade monstro, entre outros.
O poder de atração das estrelas em detrimento da marca valiosa de certas franquias também se altivou. Impossível pensar que Homem de ferro 3 alcançaria a marca que alcançou sem Robert Downey Jr. Basta olhar para os outros filmes da Marvel. Brad Pitt provou poder de fogo e Leonardo DiCaprio competiu contra franquias milionárias  e conseguiu ótima bilheteria para seu O grande Gatsby.
Se houve um grande perdedor na temporada, este foi Johnny Depp. Se muitos se provaram ainda fiadores de um grande público, Depp errou feio em apostar em uma fórmula já desgastada em O cavaleiro solitário.
Outro erro foi apostar em sequências de filmes razoavelmente bem sucedidos. Red 2, Percy Jackson e o mar de monstros e Kick Ass 2 foram desastres apenas comedidos por não terem sido caros como foi, por exemplo, Círculo de fogo, que mostrou que até mesmo gênios como Guillermo Del Toro erram.
A Warner, que tomou outro petardo com o fracasso de Círculo de fogo (que só fez dinheiro na China), removeu a estreia da sequência de 300 para março de 2014, época com menos concorrência de grandes lançamentos no cinema.
Antes de fechar a conta, a temporada ainda apresentou o agosto mais lucrativo da história, surpreendendo analistas que sempre apostaram na desaceleração das bilheterias no referido mês que conta com poucos (ou nenhum) lançamento de expressão. O verão de 2013 pode ser a primeira pista de que o inverno está chegando...

sábado, 14 de setembro de 2013

Crítica: Rush - no limite da emoção


...e os deuses eram mortais!

A Fórmula 1 já não é a mesma e você não precisaria assistir Rush - no limite da emoção (Rush, EUA 2013) para tomar ciência disso, mas a certeza surge irretratável findada a sessão do novo e eletrizante filme de Ron Howard, vencedor do Oscar por Uma mente brilhante. Na segunda colaboração com o roteirista Peter Morgan (a primeira foi no não menos primoroso Frost/Nixon), o diretor adentra o circo da Fórmula 1 para mostrar os bastidores de uma das rivalidades mais cativantes e lendárias do esporte entre o inglês James Hunt (Chris Hemsworth) e o austríaco Niki Lauda (Daniel Brühl).
Rodado com extrema perícia técnica e ritmo narrativo, Rush – no limite da emoção recupera o glamour da Fórmula 1 enquanto esporte a mobilizar paixões e, em paralelo, enseja elaborado estudo de personagens diametralmente opostos no tocante à postura e personalidade, mas irmanados nos objetivos e ideais.
Howard é hábil em deixar o bom texto de Morgan dosar o desenvolvimento da narrativa, que cobre praticamente uma década, e é ainda mais perspicaz ao aferir às cenas de corrida a logística das transmissões televisivas, expediente semelhante ao adotado por David O. Russell em O vencedor (2010). Rush é um filme muito bem fotografado naquilo que tem de particular, ressaltando o excelente trabalho de direção de arte.
No comando de tudo isso, Howard parece interessado em negritar o antagonismo crescente entre essas duas figuras que só enxergavam a grandeza em seus destinos.

Prontos para triunfar ou morrer: os códigos do western servem ao propósito de Howard de sublinhar os alcances de uma "simples" rivalidade entre pilotos

Chris Hemsworth tem a oportunidade de mostrar viço dramático na pele do inconsequente Hunt. O ator não precisa de muito para esbanjar carisma, mas quando exigido dramaticamente entrega o que a cena pede. E Rush exige muito de Hemsworth que precisa revelar um personagem cheio de vaidades, defeitos e ainda assim atraente ao olhar da audiência. É preciso um ator seguro para dar conta de um personagem tão complexo e que, a rigor, não detém o protagonismo da fita. Daniel Brühl, por sua vez, demora a achar o compasso certo de seu Lauda. O sotaque soa forçado no início e o tom caricatural demonstra todo o desconforto que tanto caracterizou Lauda em seu início na Fórmula 1. Mas é justamente trabalhando nessa ideia de desconforto que Brühl vai em um crescente até atingir seus melhores momentos no filme, no grande clímax da fita e deu seu personagem, por força do acidente no grande prêmio da Alemanha na temporada de 1976, que seria vencida por Hunt.

Se não toma partidos, Rush oferta a lógica do western no ambiente da Fórmula 1. Ideia que fica clara quando Hunt nocauteia um repórter depois dele ter feito uma pergunta desrespeitosa a seu arqui-rival em uma entrevista coletiva.  O que move Rush em termos de dramaturgia não é necessariamente a ideia de desmistificar seus biografados, ainda que resvale na mortalidade dos mitos, mas de observar que a ideia de antagonismo não torna apenas o esportista melhor, mas também o homem. Quiçá o mito. Ao apresentar esses dois homens como aventureiros destemidos que desenvolveram profundo respeito e admiração entre si, Howard trabalha com códigos típicos do gênero do western para revigorar o mitológico universo da Fórmula 1. Este que já não é o mesmo, mas que Rush oferece um vislumbre de seu glorioso passado.  

Momento Claquete # 36

A cena no festival de Toronto 2013

 O vocalista do Maroon 5 Adam Levine e Keira Knightley, que contracenam em Can a song save your life? curtem um after party da Fox Searchlight

 Alexandre Aja, na extrema direita, e o elenco de Horns, misto de fantasia, terror e comédia de humor negro estrelada por Daniel Radcliffe

 Ewan McGregor e Jason Bateman batem aquele papo...

Jude Law, sem frisar na calvíce cada vez mais acentuada, presta atenção no jornalista que o questiona na coletiva de imprensa de Don Hemingway

 Ainda amigos: 16 anos depois de O casamento do meu melhor amigo, Julia Roberts e Dermot Mulroney atuam juntos em uma das sensações de Toronto, Agust: osage county

 The Hemsworth boys: os irmãos Liam, Chris e Luke

 O roteirista Peter Morgan, o ex-piloto de Fórmula 1 Niki Lauda e o ator que o viveu em Rush-no limite da emoção, Daniel Brühl

Scarlett Jonhansson e Joseph Gordon-Levitt riem e pousam para fotos. Não necessariamente nesta ordem...

 O cineasta Steve McQueen e o ator Michael Fassbender falam sobre a grande sensação do evento, 12 years a slave

Tom Hiddleston, Mia Wasikowska e Anton Yelchin tentam ficar sérios...

Fotos: L.A Times e Getty Images

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Em off

Nesta edição da seção Em off,  Jerry Bruckheimer em maus lençóis, 50 tons de cinza se recusa a sair da pauta, o novo logotipo de Claquete, Rush-no limite da emoção e os filmes velozes, dicas para a sexta-feira 13 e algumas reminiscências do festival de Toronto.

O filme mais sexy de Ron Howard
Piloto com pinta de Deus nórdico: Chris Hemsworth traz sexy appeal para o circo da fórmula 1 de Ron Howard

Essa foi a definição do parceiro e produtor Brian Grazer quando viu o primeiro corte de Rush- no limite da emoção. “Eu não acreditei”, disse em entrevista a Entertainment Weekly. Howard, com uma filmografia respeitável e diversa, realmente não prisma por fazer filmes que se enquadrem na etimologia de sexy.  Do brega Splash-uma sereia em minha vida ao acadêmico Uma mente brilhante, passando pelo classudo Frost/Nixon ou pela aventura O código DaVinci, seus filmes foram tudo, mesmo sexies. Howard se vê em nova colaboração com Peter Morgan (o roteirista de Frost/Nixon) para falar da maior rivalidade da história da Fórmula 1 que se deu na década de 70. Rush- no limite da emoção, que estreia nesta sexta-feira (13) nos cinemas brasileiros, traz Chris Hemsworth e Daniel Brühl como o inglês James Hunt e o austríaco Niki Lauda que incendiaram o circo da fórmula 1 com uma rivalidade alçada à mitologia do esporte. O filme de Howard, que busca a maior veracidade possível nas cenas de corrida, dá aquela piscadela para o que acontece nos paddocks e, também, fora deles.

Filmes em alta velocidade
Filmes sobre automobilismo não são exatamente os mais concorridos quando Hollywood vai buscar inspiração no esporte, mas mesmo assim há uma galeria respeitável de filmes passados no mundo da velocidade.  Dias de Trovão, Carros, Alta velocidade e As 24 horas de Le Mans são alguns deles. Confira todos nesta galeria montada pelo AdoroCinema

Cena de Alta velocidade: o S é de Stallone...

Reminiscências de Toronto – parte I
O festival de cinema mais concorrido do ano acaba no próximo domingo, mas seus vestígios serão sentido até o próximo Oscar. O entusiasmo com que os filmes têm sido recebidos em Toronto não guarda precedentes com as edições anteriores ou com qualquer festival de grande projeção realizado neste ano. Muitos pretensos candidatos ao Oscar consolidaram suas posições. Os mais bem colocados nessa lista são 12 years a slave e Gravidade, que segundo os principais críticos presentes em Toronto, já podem ser dados como certeza entre os indicados a melhor filme do ano.

Reminiscências de Toronto – parte II
Outro aspecto que tem cativado em Toronto é a força de certos atores. Benedict Cumberbatch é um frisson, mas Chiwetel Ejiofor e Michael Fassbender, ambos por 12 years a slave, Josh Brolin e Kate Winslet (Reféns da paixão), Julia Roberts e Meryl Streep (August: osage county) e Matthew McConaughey e Jared Leto (Dallas buyers club) mesmerizaram público e crítica.  

Nova estampa

Talvez você já tenha reparado, mas em caso negativo eis aí o novo logotipo de Claquete. Cortesia do leitor Fábio Montanari que achava, com toda a razão, que faltava ao blog esse toque de finesse. Fica aqui registrado o agradecimento do blog ao Fábio.

Ainda 50 tons de cinza...
Tema de alta voltagem midiática e que, ao que parece, segue longe do esgotamento diz respeito aos protagonistas de 50 tons de cinza. Que a as escolhas de Charlie Hunnam e Dakotta Johnson não agradaram já se sabia, mas que tal uma espiada na justificativa de algumas fãs. É o que possibilita a matéria do AdoroCinema que repercute enquete promovida pelo site sobre as escolhas do casting do filme que será dirigido por Sam Taylor-Johnson. Confira!

O prestígio de Jerry Bruckheimer na berlinda...
Jerry Bruckheimer já não tem a influência de outrora na Disney. Principalmente depois do fracasso retumbante de O cavaleiro solitário. Se fosse hoje, talvez, ele não conseguisse manter Johnny Depp como Jack Sparrow a contragosto dos executivos do estúdio – história que já é célebre nos anais de Hollywood. Ainda no universo de Piratas do Caribe, caiu como uma bomba a notícia de que o quinto filme Dead men tell no tales será adiada de 2015 para, a princípio, 2016. De acordo com Bruckheimer, a Disney “está mais cuidadosa” depois do fracasso de O cavaleiro solitário, mas segundo reportagem do The Hollywood Reporter, o buraco é mais embaixo. O roteiro do filme não agradou tanto do ponto de vista financeiro como narrativo. Bruckheimer agora precisa se ajustar aos padrões que a Disney enxerga desejáveis para a franquia.

Para curtir a sexta-feira 13!

Se fosse em outubro, seria perfeito. Quis o calendário que setembro também tivesse suas bruxas e não vai faltar opção para quem quiser curtir a sexta-feira 13 a caráter. Além da elogiada e aguardada estreia de Invocação do mal, um dos filmes de terror mais benquistos dos últimos anos, alguns canais da tv por assinatura prepararam maratonas espertas como o MAX e o Megapix. O primeiro exibe, a partir das 17h, três belos filmes de terror. Os estranhos, Sexta-feira 13 e dá início aos trabalhos com o clássico Poltergeist – o fenômeno. Os filmes selecionados pelo Megapix são menos assustadores, mas mantêm o bom nível da empreitada. A brincadeira começa às 20h25 com O sexto sentido e continua com Jogos mortais – o final e Pânico no lago 3.